‘Meninos Bons de Bola’ treinam aos domingos e trocam ideias sobre namoro, tratamento hormonal e cirurgias. Nesta quarta (17) é celebrado o Dia Internacional da Luta contra Homofobia e Transfobia.
Uma quadra de esportes na região central de São Paulo é o local escolhido por um grupo de rapazes transgêneros (que nasceram biologicamente do sexo feminino mas se identificam como masculino) para se reunir, jogar bola e trocar ideias sobre muitas coisas em comum: paixão pelo futebol, namoros, tratamentos hormonais e cirurgias. Mais do que um time, os integrantes dos “Meninos Bons de Bola” formam uma família.
A ideia de formar um time surgiu há cerca de nove meses em uma conversa entre o orientador socioeducativo transgênero Raphael e a psicóloga Moira Escorse, quando ambos eram amigos e colegas de trabalho no Centro de Referência e Defesa da Diversidade (CRD) da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, diz o G1.
“Pesquisei e vi que muitos meninos transgêneros já tentaram suicídio e estavam saindo ou entrando em uma depressão, como eu. Junto com a Moira, pensamos: ‘Por que não fazer uma atividade que una esses meninos como uma família para conversar sobre hormônios, cirurgias e namoradas?’”, lembra Raphael, que tem 30 anos e, embora tenha nascido biologicamente menina, sempre se identificou como menino.
O primeiro treino dos “Meninos Bons de Bola” aconteceu no dia 28 de agosto de 2016, no Parque da Juventude, na Zona Norte de São Paulo, e reuniu cerca de 30 meninos trans que Raphael convocou por meio de grupos que participa nas redes sociais.
“Depois da primeira partida, sentamos em círculo e cada um contou um pouco da sua história. Foi bem forte. Somos invisíveis ainda e temos necessidade de falar”, afirma Raphael, que embora tenha nascido biologicamente menina, sempre se identificou como menino. “Hoje, se um de nós compartilha pensamentos negativos, acolhemos. Damos bronca, parabéns, nos incentivamos. Nos tornamos uma família”, acrescentou.
A psicóloga Moira Escorse, que além de trabalhar no CRD também atende em uma clínica particular, conta que acompanhou os momentos iniciais de formação deste time. “Os meninos compartilhavam olhares e silêncios que confortavam e ajudavam a aliviar o peso de ser quem se é. Porque no fundo eles pagam um preço bastante alto perante esta sociedade machista, patriarcal e preconceituosa”, diz Moira.
Nesta quarta-feira (17) é celebrado o Dia internacional da luta contra a homofobia e transfobia.
A especialista explica que estratégias de interação, seja via debates, discussões ou esporte, podem colaborar com o bem-estar deste público e favorecer aberturas individuais. “Existe uma imensa tendência ao isolamento, mas enfatizo que é uma depressão pressionada pela sociedade, que exclui esta pessoa ao mostrar que ela não tem lugar de pertencimento, que não tem reconhecimento enquanto indivíduo de direito e de afetos, sendo que assim, cabe a pessoa transexual o lugar da exclusão ou da depressão e/ou suicídio, seja físico, psicológico ou moral”, completa.
Meninos Bons de Bola
O time de futsal conta com 20 jogadores; três deles jogaram no futebol profissional, e os demais no amador. Os treinos aconteciam no Parque da Juventude, mas mudaram de endereço desde que 20 homens abordaram o grupo dizendo que não poderiam continuar ali.
Eles conseguiram doação de uniformes, chuteiras e bolas, mas não têm mais parceiros e estão sem técnico também. A equipe já participou de sete jogos em festivais e amistosos, e tem a meta de entrar em alguma competição ainda no segundo semestre deste ano.
Os jogadores procuram caminhar ou correr durante a semana, não só por conta dos treinos, mas também devido às doses de hormônios, que causam ganho de peso se não houver controle de alimentação e exercícios.
Nem todos no time fazem o tratamento com hormônios ou se preparam para cirurgia, e apenas o jogador Cláudio Galícia (apelidado ‘Vovô’, o mais velho do elenco) já fez a mudança do nome, mas cada atleta está em uma fase especial da transição.
17/05/2017