Genro do presidente ganha mais funções e, junto à mulher, aumenta sua influência

O novo gabinete foi descrito pelo diário “Washington Post” como uma força-tarefa de executivos planejada para trazer uma nova mentalidade ao governo, distante das disputas políticas diárias, e capaz de criar um legado duradouro para um presidente que ainda busca levar sua marca a Washington. No organograma da administração federal, a estrutura ficará subordinada diretamente a Trump.
— Devemos ter excelência no governo — afirmou Kushner em entrevista no domingo, em seu escritório na Casa Branca. — O governo deve ser comandado como uma grande empresa americana. Nossa esperança é que consigamos ser eficientes para nossos clientes, os cidadãos.
Segundo o jornal, a equipe de Kushner será composta de ex-diretores do setor privado com foco na inovação. As áreas de tecnologia e de dados vão estar no centro desta nova unidade, e a Casa Branca vem trabalhando com figuras referências no ramo, como o CEO da Apple, Tim Cook, e o fundador da Microsoft, Bill Gates.
“Prometi ao povo americano que iria produzir resultados, e aplicar minha mentalidade ‘antes do prazo, abaixo do orçamento’ ao governo”, afirmou Trump em comunicado.
‘Lealdade inabalável’
Desde a vitória de Trump na eleição do ano passado, o papel no governo do casal Kushner-Ivanka — que esteve no centro da campanha do bilionário — tem sido motivo de preocupações e críticas. Em dezembro, antes da posse do magnata, a presença de Ivanka numa reunião com o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, foi questionada, já que a filha do presidente mantinha negociações com companhias que pertencem ao governo japonês. Já seu marido, assessor sênior da Casa Branca, também foi criticado por um encontro com representantes chineses com os quais mantinha negociações pendentes relativas aos negócios de sua família. Os dois abandonaram funções de comando em suas empresas, mas isso não foi suficiente para dissipar a desconfiança em relação a sua participação no governo.
Ao anunciar que se mudaria para a capital, Ivanka disse que se concentraria em sua família e seus três filhos. No entanto, desde a chegada de Trump à Casa Branca, ela já participou de encontros com líderes mundiais como o primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, e a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e representará oficialmente os EUA num encontro do G20 (as 20 maiores economias do planeta) sobre empoderamento feminino no fim do mês. Além disso, foi apontada pelo presidente como o nome por trás de seus planos de reformas no sistema de creches e na licença-maternidade. Segundo o site “Politico”, Ivanka está a um passo de ter autorização para receber memorandos internos confidenciais do governo, algo que a equipe de comunicação da Casa Branca não negou, mas evitou comentar.
Em um artigo no “Post”, Helen Klein Murillo e Susan Hennessey, da Brookings Institution, um centro de estudos de Washington, apontam que, embora a participação de Ivanka no governo seja possível segundo a lei federal antinepotismo, ela certamente representa um dilema ético, já que suas muitas ligações financeiras não reveladas aumentam as possibilidades de que decisões sejam tomadas tendo em vista ganhos individuais, e não os interesses nacionais. Segundo a dupla, expor a filha do presidente a documentos de alta confidencialidade pode colocar a segurança dos Estados Unidos em risco.
Já Kushner ocupa menos espaço nas páginas dos jornais, mas, diferentemente de Ivanka, integra oficialmente o grupo de principais assessores do presidente, ao lado do chefe de Gabinete, Reince Priebus, do ex-chefe da equipe de transição, Stephen Miller, e do estrategista-chefe Steve Bannon. A polêmica viagem de Trump ao México durante a campanha — no auge da controvérsia causada pelo anúncio dos planos de construção de um muro na fronteira — foi concebida e coordenada por Kushner, conhecido pelo que muitos classificam como “inabalável lealdade” a Trump. Ele também está envolvido na elaboração da política do presidente em relação ao conflito palestino-israelense — sua família tem envolvimento no financiamento de assentamentos na Cisjordânia.
Depoimento em investigação do senado
No entanto, a proximidade com o presidente também o colocou na mira da Comissão de Inteligência do Senado, que investiga a possível interferência da Rússia na eleição de 2016. Até agora, a Casa Branca só reconheceu um único encontro entre Kushner e o embaixador russo, Sergey Kislyak, na Trump Tower, em dezembro, numa reunião que contou com a presença do ex-conselheiro de Segurança Nacional Michael Flynn, afastado por ter mantido em segredo do vice-presidente Mike Pence seus encontros com o diplomata.
Hope Hicks, porta-voz da Casa Branca, confirmou que Kushner também se reuniu com Sergey Gorkov, chefe do Vneshconombank, banco estatal de desenvolvimento da Rússia, atingido pelas sanções impostas ao país após a anexação da península ucraniana da Crimeia. Kushner deve prestar depoimento na comissão.
— Ele não está tentando esconder nada, e quer que tudo seja apresentado de forma transparente — afirmou Hicks.