Cristiana Toscano, integrante do grupo consultivo sobre vacinas da Organização Mundial da Saúde (OMS), destaca a importância do Brasil como país de liderança regional e com experiência na área de imunização reconhecida internacionalmente. No entanto, os últimos anos têm sido marcados por preocupações em relação ao país. Toscano ressalta que o Brasil ainda está entre os 10 países com o maior número de crianças que nunca receberam qualquer tipo de imunizante, contribuindo para os números alarmantes de crianças “zero dose”. Essa situação fragiliza o país nas negociações e em sua posição nos fóruns multilaterais internacionais.
A diretora da SBIm, Isabela Ballalai, também percebeu uma mudança na imagem do Brasil nos fóruns internacionais de saúde global. Ela destaca que essa mudança está relacionada à resposta do governo à pandemia de covid-19. A médica lamenta o fato de que autoridades do governo receberam publicamente militantes antivacinistas durante uma audiência pública sobre vacinação pediátrica contra a covid-19, propagando desinformação sobre o assunto. Além disso, uma nota técnica da Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos (SCTIE) chegou a sugerir que a hidroxicloroquina tinha eficácia no combate ao vírus, enquanto desacreditava a vacinação.
Deisy Ventura, vice-coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Saúde Global e Sustentabilidade da Universidade de São Paulo (USP), destaca a necessidade de memória e reparação em relação às ações do Brasil nos últimos anos. Ela enfatiza que é preciso lembrar das entidades oficiais que divulgaram desinformação e notícias falsas sobre a covid-19, expondo a população brasileira a riscos evitáveis. Ventura defende que o Brasil retome seu protagonismo no campo da imunização e seja um ator influente na “diplomacia das vacinas”. Ela ressalta que o Sistema Único de Saúde (SUS) é referência para o mundo e deve ser valorizado.
Ventura também destaca a importância de o Brasil desenvolver um posicionamento autônomo em relação à saúde global, deixando de privilegiar modelos e manuais importados do mundo desenvolvido. Ela ressalta que o país possui massa crítica e um grande sistema de saúde e pesquisa, que lhe permite construir sua própria visão sobre o mundo e a saúde global. A especialista destaca a desigualdade no acesso às vacinas como um problema grave, criando um “apartheid vacinal”. Ela ressalta que a “diplomacia das vacinas” não se trata apenas de ética e solidariedade, mas também de eficiência na resposta a pandemias. O mundo só estará seguro quando todos estiverem seguros.