Mulheres que se ajudam: hub alagoana auxilia mães empreendedoras em todo o país

A ideia ganhou forma durante momentos de tensão entre maternidade e trabalho



Por: Erika Basílio

Ser mãe não é uma função simples. Aquelas que o são sabem como é difícil conciliar qualquer outra ocupação com esse papel tão importante e necessário. No Brasil, existem cerca de 10,4 milhões de mulheres empreendedoras, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE, divulgada em março de 2025. Ainda de acordo com a pesquisa, esse é o maior número registrado na história. Destes, é revelado que mais da metade dessas mulheres são chefes de família, ou seja, são mães. Destas 10,4 milhões, 67% lidam com a maternidade e o empreendedorismo, de acordo com a pesquisa “Empreendedorismo Feminino” do Sebrae. 

Em Alagoas, apesar de não haver um número definido de mulheres que são mães e empreendedoras, o número de mulheres donas do próprio negócio vem aumentando. Segundo dados da Junta Comercial do Estado de Alagoas (Juceal), divulgados em março de 2025,  o estado possui 96.787 empresas comandadas por mulheres, representando um aumento de 15,99% em relação ao ano anterior. 

Vanessa Lima, é uma dessas empreendedoras. Alagoana, mãe de 2 filhos e idealizadora do Hub Mamãe Empreende, viu no maternar uma forma de ajudar outras mães a serem donas do próprio negócio, conciliando trabalho e a maternidade.

De um susto ao Mamãe Empreende

A ideia nasceu em 2016, com o Workshop Mamãe Empreende, mas só foi se concretizar em 2018, após Vanessa quase perder o segundo filho. Com um negócio anterior já consolidado, ela o viu fechar, pois a saúde do filho era sua prioridade. “Naquele momento, decidi ser mãe, viver a maternidade. Decidi cuidar dele, porque sem ele, nada fazia sentido”, conta Vanessa. Sem a sua floricultura veio a ideia de fazer lives para ajudar mulheres a transformar sua paixão em um negócio digital, além de especializações através de cursos. Assim, o apoio chegou em nível nacional.

Com a pandemia em seu auge em meados de 2020, a empreendedora viu uma oportunidade de ajudar outras mães que precisavam de uma renda naquele momento de isolamento. “Muitas perderam o emprego e muitas fecharam seus negócios e então precisaram se reinventar. Em 2020, veio a pandemia. No dia 20 de março de 2020, abri um grupo de mães empreendedoras. E foi tudo muito rápido — no mesmo dia, chegamos a 256 membros, que era o limite do grupo. A gente se ajudava muito naquele calor da pandemia”, explica a CEO e gestora do negócio. 

“Foi um trabalho gratuito por muito tempo, onde realmente ajudei com toda minha experiência de empreendedorismo e de criação de conteúdo, para que elas tivessem resultado”, diz a mãe que empreende há mais de 10 anos.

Quando a pandemia começou a passar — lá por setembro de 2021 — ela realizou a primeira feira de mães empreendedoras, em um shopping da capital alagoana e logo em seguida em outro. “E foi aí que eu disse: não, eu posso alinhar minhas habilidades — como já fazia feiras e eventos — com o Mamãe Empreende”, relata.

Apesar do crescimento, os desafios persistem. Segundo o Sebrae, a taxa de empreendedorismo feminino em Alagoas é de 8,1% abaixo da média nacional, que é de 24,6%, conforme dados do Sebrae baseados na Pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (Monitoramento de Empreendedorismo Global), de 2021. 

Além disso, mesmo com maior escolaridade, as mulheres empreendedoras ainda enfrentam desigualdades, como a renda média 24% inferior à dos homens no comando de empresas, ainda de acordo com estudo divulgado pelo Sebrae.

Mas Vanessa não desistiu, pois desde então, a comunidade só cresceu. “Temos parcerias com grandes shoppings — como aqui, no Shopping Pátio. Estes lugares abraçam a causa, acolhem as mães empreendedoras, valorizam o trabalho da mulher que trabalha de dentro de casa, que produz, mesmo com a tripla jornada”, revela Vanessa.

Produtos são feitos pelas próprias mulheres e vendidos nas lojas colaborativas, festivais, exposições e outros. Foto: Erika Basilio

Uma vantagem que Vanessa cita no empreendedorismo dessas mulheres é a produção de itens únicos. “Elas trazem produtos exclusivos para o shopping. Imagina: um shopping enorme, onde se encontram peças que só existem ali. Não dá pra encontrar igual ou concorrente”, explica.  “Então, é bom para o shopping, bom para elas, e ótimo para toda a sociedade. Porque além da melhora financeira, transforma a autoestima da mulher. Ela começa a se arrumar, ir pra sua loja no shopping. É uma transformação de dentro para fora — tanto pessoal quanto profissional”, explica a empreendedora. 

Como funciona o hub

Como a própria gestora diz, o Mamãe Empreende é um hub – espaços que podem ser físicos ou virtuais onde startups e profissionais das mais diversas áreas colaboram entre si. “Não é só uma loja colaborativa. Ele tem loja, tem feiras, capacitação, profissionalização, parcerias”, explica. 

“Por exemplo: fizemos uma parceria com o World Creativity Day (Dia Mundial da Criatividade), que aconteceu em Maceió. O Mamãe Empreende proporcionou esse evento. A ideia é fazer com que essas mulheres estejam onde as grandes empresas estão — e pensem como grandes empresas.”, continua Vanessa.

Com a mais nova loja colaborativa localizada no Pátio Shopping, o empreendimento atraiu fregueses em poucos minutos de inauguração. Segundo ela, o espaço é apenas um “bracinho” do hub, pois elas entendem que a rotina de uma loja dentro de um shopping é muito pesada para uma mãe, então há essa ajuda entre todas. “Temos horários flexíveis, fazemos escalas semanais — geralmente elas vêm uma vez por semana, para não pesar. E quem escolhe os horários são elas mesmas. Se uma precisa levar o filho ao médico, outra cobre. É tudo bem flexível. Uma sempre ajuda a outra”, explica.

Inauguração de mais uma loja colaborativa do Mamãe Empreende atraiu a atenção de quem passeava pelo shopping. Foto: Erika Basílio
Inauguração de mais uma loja colaborativa do Mamãe Empreende atraiu a atenção de quem passeava pelo shopping. Foto: Erika Basílio

Como é o caso da baiana Aline Frazão, que tem dois filhos e decidiu morar em Maceió após uma visita. Transplantada, ela viu no hub uma forma de ganhar dinheiro e cuidar dos filhos sem precisar abdicar de nada. “Por volta de 2020 para 2021, eu conheci a Vanessa com uma proposta simplesmente incrível. Para nós mães e empreendedoras que não temos condições, em todos os sentidos, de ter uma loja física. Então, a proposta da Vanessa em reunir mães que precisam desse apoio, para mim, à primeira vista foi algo incrível. Então, desde lá, eu não larguei mais o Mamãe Empreende, eu não larguei mais a Vanessa. Se a Vanessa disser que vai fazer uma festinha de boneca ali na esquina, eu estou pronta”, conta sorridente. 

Dona de uma papelaria, ela relata como tudo mudou após a parceria, enfatizando o quanto o empreendedorismo em sua vida foi uma “virada de chave”. “Primeiro, eu venho de uma outra cidade e ainda sou transplantada de rins, então, o empreendedorismo pra mim foi uma forma de eu me manter viva. Foi uma ressignificação na minha vida”.

“Então, quando eu conheci a Vanessa, aquele jeitinho dela que só quem conhece sabe como é, ela acaba virando amiga, ela acaba virando uma pessoa que ampara, uma pessoa extremamente empática com a situação de cada mãe, porque cada mãe tem a sua particularidade”, continua. 

Dona da papelaria Cores e Fofuras e mãe de duas crianças, Aline Frazão Foto: Erika Basílio
Dona da papelaria Cores e Fofuras e mãe de duas crianças, Aline Frazão Foto: Erika Basílio

O hub, além de ter um espaço para a venda de produtos produzidos pelas próprias mulheres, oferece apoio para empreender, com capacitações e mentorias, contando também com um aplicativo para a divulgação dos serviços, uma plataforma financeira que ajuda as mulheres a resolver dificuldades, além de um grupo de Whatsapp, onde mães de todo o Brasil conversam e trocam experiências. 

O ser mãe

De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), as mulheres brasileiras ainda têm uma carga de trabalho muito maior que os homens, dedicando 55 horas semanais ao trabalho doméstico, cuidado com os filhos e trabalho remunerado, enquanto os homens dedicam cerca de 51 horas. “Pesa mais um pouquinho mais pra mulher, né? Quando você é mãe, pesa um pouquinho mais. Mas a ajuda do Mamãe Empreende facilitou essa paixão de ser mãe, de ser empreendedora”, enfatiza Aline 

Vanessa pensa da mesma forma e sabe que a maternidade pode trazer alguns impedimentos. “Eu percebi que, quando chega a maternidade, a mulher acaba perdendo o emprego logo após voltar da licença. E quando ela começa um negócio, é por necessidade, não por escolha. Eu escolhi. Estudei administração, escolhi empreender, mas a maioria entra no empreendedorismo por necessidade”.

Rafaela Maria, de 35 anos, tem um filho, e concilia seus dias na loja colaborativa com seu negócio de buffet aos finais de semana. “Foi através da loja de essências que eu presto serviço que conheci o Mamãe Empreende e trabalhar aqui é maravilhoso. É uma oportunidade que a gente tem. Eu trabalho aqui e também tenho um mini empreendedorismo meu e consigo conciliar bem os dois junto com a maternidade”, revela. 

Apoio

Sobre apoio financeiro para manter o negócio, Vanessa explica que ainda é muito difícil, mas que com a colaboração de todas, é possível. “O recurso financeiro, hoje, ainda sai do nosso bolso. Mas temos muito apoio do Sebrae, que gera oportunidades para essas mulheres — nas feiras, treinamentos (que são muito importantes), e também para as empreendedoras de alimentação, que fazem os cursos do Sebrae”, diz.

Outro apoio que recebe, é da receptividade dos centros comerciais e de mulheres da política alagoana que acreditam no empreendimento feminino.  “Tudo aqui é aluguel social — não teríamos como pagar o aluguel de uma loja enorme como essa. Então, o shopping é nosso parceiro. Temos também apoio de deputadas, por exemplo, que ajudam com estrutura para eventos. Se tem algo a ser dividido financeiramente, a gente rateia entre nós mesmas, que somos todas empreendedoras. A gente se vira. Mas em termos de apoio, estrutura, capacitação, oportunidades, temos parceiros locais e nacionais — como o próprio World Creativity Day, que é uma organização reconhecida pela ONU”, diz Vanessa, que ainda pretende expandir a loja colaborativa para outros lugares do Brasil.

“Então tudo o que fazemos tem esse propósito: trabalho digno, com apoio e em comunidade”, finaliza a mãe empreendedora. 

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