O aumento de notificações de casos de Dengue em 100 municípios alagoanos foi de 68,94%emrelação ao mesmo período do ano de 2014. A proliferação do mosquito Aedes Aegypti tem preocupado a população, principalmente, nos efeitos causados na saúde dos alagoanos, como a possível relação do Zika Vírus com o nascimento de bebês com microcefalia. Nesta matéria especial, o CadaMinuto Press traz as opiniões de especialistas, a visão de políticos sobre a atuação do governo no combate ao problema e um cenário da situação enfrentada nos municípios.
Dados da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) apontam que nove municípios estão em situação epidêmica com notificações que superam 300 casos de Dengue por 100mil habitantes. Acompanhado da Dengue, a Febre Chikungunya e o Zika Vírus, doenças também transmitidas pelo mesmo mosquito, colocaram 39 municípios em situação de risco de surto e 34 municípios em alerta. Apenas duas cidades alagoanas ainda não tiveram notificações confirmadas dessas doenças.
Maceió é o município com mais notificações dos casos de microcefalia, chegando a 25 casos, segundo o último boletim emitido pela Sesau. A capital alagoana está inserida na lista das cidades em situação de emergência devido ao Aedes Aegypti.
O setor de Vigilância em Saúde de Maceió estuda realizar uma transferência dos agentes de endemias lotados no programa de controle ao mosquito Aedes Aegypti para controlar o crescimento de casos nos bairros Pajuçara e Ponta Verde. Apesar da intensificação das ações da Secretaria Municipal de Saúde, os trabalhadores relatam dificuldades.
Além de apontarem áreas descobertas de assistência dos agentes de endemias, o Sindicato dos Agentes de Saúde da capital afirma não ter conseguido realizar todas as visitas estabelecidas pelo Ministério da Saúde, que preconiza no máximo seis visitas ao ano em um único imóvel. “Nós estamos fechando o calendário deste ano e não conseguimos nem realizar a segunda visita. O Ministério da Saúde ainda prevê um número menor de quatro visitas, diante de tantos fatores. Mas nós não vamos conseguir a meta”, disse o representante da categoria Maurício Sarmento.
Segundo ele, o número insuficiente de agentes de endemias na cidade tem possibilitado que algumas regiões, a exemplo do bairro do Farol, fiquem descobertas da assistência e visitação. Este fato é rebatido pela coordenadora de Vigilância em Saúde de Maceió, Thais Barreto.
Ela contesta a inexistência de áreas descobertas pela assistência, afirmando que atualmente Maceió conta com um número pequeno de agentes de saúde. Dados fornecidos pelo Sindicato, cerca de 900 trabalhadores estão divididos nos programas de prevenção executados pelo setor epidemiologia.
“Nós temos uma série de problemas que acarretam na proliferação do mosquito, que vão desde a questão estrutural até a falta de material para o trabalho. Hoje não temos veículos para atender comunidades que estão localizadas na zona rural, assim como passamos quase três meses com a quantidade de larvicida reduzida. A situação hoje de Maceió é de alerta, mas infelizmente isso não tem sido tratado com atenção”, disse Sarmento.
Faltaram agentes, larvicida e equipamento na guerra contra o mosquito0
A coordenadora de Vigilância em Saúde de Maceió, Thais Barreto, lembra que os esforços da Secretaria Municipal de Saúde têm sido concentrados nas áreas com maior incidência e confirma uma redução dos números dos casos de Dengue com relação ao mesmo período do ano passado. “No último boletim informativo, nós tivemos 3.654 casos registrados em 2015, enquanto no ano passado tivermos mais de 5 mil casos. Maceió está em situação de alerta e estamos concentrado os esforços nos pontos mais críticos”, afirmou a coordenadora.
Barreto acrescenta que os números de casos na Pajuçara e Ponta Verde têm sido ocasionados pela quantidade de prédios abandonados e alguns fatores da área.
A própria nota técnica da Sesau confirma que a pouca quantidade de agentes endemias em todo estado é um dos pontos que fragiliza o controle do mosquito. Ao listar alguns fatores, o órgão estadual apresenta EPI (equipamento de segurança para trabalho) incompleto, adoção de horários corridos, alto número de faltas ao trabalho e uma ausência de controle dos supervisores.
Alagoas também ficou três meses sem receber o larvicida de combate ao mosquito. E, quando recebeu, em pleno alerta e surto da microcefalia que pode ter relação com a Zika, o Ministério da Saúde encaminhou apenas uma tonelada, metade da quantidade prevista para Alagoas, segundo a Sesau.
Mesmo com os números preocupantes, a Sesau informou que trabalho de combate ao mosquito não se restringe apenas ao uso de larvicida em locais que podem apresentar um foco de larvas a serem exterminadas. Segundo o órgão, “Partindo desse entendimento, os municípios atuam no manejo mecânico dos criadouros com a ajuda da população. Ou seja: cobrindo recipientes e lixos descartados em locais adequados, entre outras ações. Não houve interrupção da visita do agente. Afinal, o mais importante é eliminar o criadouro de forma definitiva; ainda em sua concepção”.
A Saúde do Estado não descarta a possibilidade de solicitar apoio do Exército, mas não enfatiza ajuda aos municípios que não dispõe de agentes para atuar fortemente no controle. Além disso, o governador ainda avalia a possibilidade de decretar situação de emergência sanitária em Alagoas.
Neuropediatra alerta que pelo menos 90% das crianças terão sequelas
A Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) formou um grupo técnico para acompanhar a situação dos 97 casos de microcefalia em Alagoas. A malformação do sistema nervoso dessas crianças pode resultar em sequelas que seguirão irreversíveis, como um déficit auditivo e déficit cognitivo, que são alterações na maneira como o indivíduo processa uma informação. Funções relacionadas à inteligência, como a memória, linguagem, raciocínio lógico e abstrato, atenção, percepção, capacidades executivas e capacidade visual espacial.
O neuropediatra Flávio Santana alerta que pelo menos 90% das crianças que diagnosticadas com microcefalia apresentarão um déficit cognitivo. “A microcefalia é uma malformação do sistema nervoso. Então, nós estamos começando acreditar que o Zika Vírus entra no sistema nervoso no período de formação em que o celebro está se desenvolvendo e causa essa malformação”, expôs Santana.
O especialista ainda coloca que muitos desses bebês podem apresentar uma epilepsia de fácil e difícil controle, que pode ser tornar um comprometimento mais grave, pois elas também correm o risco de se desenvolver sem fala ou até mesmo sem conseguir andar. “É um atraso no desenvolvemos, que pode chegar uma paralisia cerebral grave”, acrescentou ele. Ao destacar as sequelas, Santana também fala da necessidade da assistência médica.
“São crianças que vão precisar de reabilitação, de acompanhamento de fisioterapia, fonoaudiologia. Uma grande parte necessitará desse acompanhamento para ter um desenvolvimento. Fora o acompanhamento com o neuropediatra”, disse.
Governador decreta emergência em AL, mas oposição critica omissão
Somente no fim da tarde da última quinta-feira (10), o governador Renan Filho (PMDB) confirmou a decretação de situação de emergência em Alagoas, para facilitar o combate ao mosquito Aedes aegypti. A publicação no Diário Oficial do Estado foi confirmada para a edição desta sexta-feira, (11).
“É muito importante que todos possam divulgar, sobretudo nas cidades com mais riscos do Zika Vírus, Dengue e Chikungunya. Nós vamos colocar carros de som nas ruas, informas as mães, informar as famílias, por que a informação é a principal forma dela se precaver, pois ela combate o foco na sua casa. Combatendo o foco na sua casa, vai melhorar a rua, a cidade e o Estado”, justificou Renan Filho.
O decreto, segundo Renan Filho, vai facilitar os municípios a combater o mosquito e permitir ao Estado promover contratação de pessoas para barrar o avanço destas doen- ças provocadas pelo Aedes aegypti. O líder do governo na Assembleia Legislativa, deputado Ronaldo Medeiros (PT), disse que já foi protocolado na Casa uma sessão pública para debater a situação em Alagoas da microcefalia e ações de combate ao mosquito transmissor. Ele destacou que a população também precisa estar atenta para eliminar focos do Aedes Aegypti e dos cuidados para que não haja mais casos de Zika e consequentemente microcefalia.
“É uma questão complicada essa da microcefalia, pois requer mudanças de comportamento das pessoas. O mosquito que transmite é um mosquito urbano que se prolifera onde as pessoas não possuem cuidado. Secada um fizer sua parte, em casa, no trabalho, a gente não teria esse problema que está ocorrendo hoje. É uma questão nacional, principalmente no Nordeste. Existem medidas que estão sendo tomadas e o governo tem que investir na parte educativa, além do cuidado que se deve ter em casa”, disse Medeiros.
Para o deputado de oposição, Rodrigo Cunha (PSDB), a situação que Alagoas está é séria e precisa de ações que alertem à população para os cuidados necessários a serem tomados no combate ao transmissor do Zika Vírus e das demais doenças.
“Estamos diante de um fato sério que causa a sensação de insegurança, pois o mosquito não escolhe idade nem classe social. É importante que a Sesau informe os números, o governo precisa investir em publicidade útil que influa na saúde dos alagoanos e não em marketing de obras e outras coisas. Precisamos evoluir muito. Porém não podemos colocar toda a culpa no governo. Precisamos fazer a nossa parte agora, não depois”, afirmou.
Cunha também disse que vai solicitar à Secretaria de Estado da Saúde dados sobre os casos registrados de microcefalia em Alagoas este ano e de anos anteriores.
“É importante analisar os casos já que nem todos os registrados podem ter sido causados pela Zika, vou cobrar providências”, completou.
Governo Federal reduziu limite de contratação de agentes nos municípios de AL
Se há uma coisa que afetaram os municípios brasileiros em 2015, ela se chama redução de recursos. Redução nos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), no teto MAC (Média e Alta Complexidade) do SUS e também no número de agentes de endemias. Uma portaria publicada pelo Ministério da Saúde em julho deste ano, nª 1025/2015, redefine o quantitativo máximo de Agentes de Endemias (ACE) que ficam passíveis de contratação pelos municípios brasileiros com o auxílio da Assistência Financeira Complementas (AFC) da União.
Na prática isso quer dizer que o Governo Federal autorizou a redução de agentes de endemias justamente no período que vários estados já começavam a apresentar casos de Zika, Febre Chikungunya e Dengue. Em Alagoas o número de agentes caiu de 2006 para 899.
Se o combate ao mosquito transmissor já sofria com dificuldades em vários municípios alagoanos, a situação só se complicou. O presidente da Associação dos Municípios Alagoanos (AMA), Marcelo Beltrão, esteve em Brasília para o lançamento do Plano Nacional de Enfrentamento à Microcefalia, que contou com a presença de governadores, prefeitos e outras autoridades.
Apesar da principal preocupação de gestores de saúde do Brasil se voltar para os casos de má formação congênita nos bebês, houve também pedidos e diálogos em torno desta portaria, Segundo Beltrão, o governo federal precisa rever a medida, já que a situação em vários estados é complicada.
“Os municípios alagoanos sofreram bastante com a revogação da portaria 1025/2015. Nós tínhamos 2006 agentes de endemias e após a portaria caiu para 899. O agente de saúde é um dos principais atuantes nessa luta de combate ao mosquito transmissor. Agora nós temos poucos profissionais para uma extensão territorial muito grande. Em Brasília foi exposto o conteúdo da portaria, além do Teto MAC, pois quem é que vai cuidar desses bebês e gestantes doentes? Os municípios estão fragilizados e precisam de apoio e estrutura”, afirmou Beltrão.
A preocupação de Marcelo Beltrão não é à toa. O anexo disponível junto à portaria expõe bem a situação crítica que se encontram os municípios. De acordo com os dados, Mata Grande, por exemplo, que segundo a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) tem surto de Febre Chikungunya, só poderá contratar com os recursos do AFC três agentes de endemias. Santana do Ipanema e Delmiro Gouveia, que registram muitos casos de Zika, terão direito a 15 e 12 agentes, respectivamente. Maceió, que também concentra casos de dengue, Febre chikungunya e Zika é o município do estado com mais agentes, 365, seguida de Arapiraca, com 64, segundo a portaria ministerial.
Já o Plano Nacional, lançado para enfrentar a microcefalia, vai atuar de forma integrada, com ações de educação, combate ao transmissor e conscientização da sociedade. Vão integrar essa frente secretarias de saúde, as forças armadas, a sociedade civil organizada e entidades diversas.
“Serão instaladas salas de controle, que vão desenvolver e coordenar todas as ações que serão feitas nos municípios. Estes vão executar e repassar a estas salas de controle todas as informações e resultados obtidos. Mas os municípios precisam de apoio e estrutura para conseguir fazer tudo. Já sofreram muito com a diminuição dos agentes de endemias e é necessário que o governo federal reveja alguns pontos e a questão dos recursos”, ponderou o presidente da AMA.
“Claro que a população precisa fazer sua parte. Não é só a microcefalia. O Aedes Aegypti transmite outras doenças e é preciso empenho de todos. Os municípios estão combatendo, irão fazer um plano de atuação forte agora no final do ano. O que está acontecendo agora é resultado do verão passado, então o cuidado é para que nesse verão não ocorra a mesma coisa, a seca, por exemplo, atinge muitos municípios e essa falta de água na zona urbana dessas cidades faz com que os principais focos sejam os tonéis e baldes que as pessoas usam para armazenar água. Em outros estados, como em Pernambuco, o Exército está atuando, então se for necessário as forças armadas irão no ajudar também, mas é preciso que todos façam sua parte”, concluiu.
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