A Folha revelou que o gabinete do ministro Alexandre de Moraes pediu, de maneira não oficial, a produção de relatórios pela Justiça Eleitoral. Esses documentos foram utilizados para fundamentar decisões no inquérito das fake news no STF, durante e após as eleições de 2022. As mensagens trocadas pelos assessores do ministro abrangem um extenso período, de agosto de 2022 até maio de 2023.
Moraes atuava simultaneamente em duas frentes: como presidente do TSE e relator do inquérito das fake news no STF. A Justiça Eleitoral brasileira, que não possui um quadro próprio de juízes, organiza-se com magistrados oriundos de outras cortes, incluindo o próprio STF e o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Assim, essa sobreposição de funções do ministro em tribunais diferentes é uma especificidade do sistema eleitoral do Brasil.
O gabinete de Moraes defende que todos os procedimentos foram oficiais, regulares e devidamente documentados, com a integral participação da Procuradoria-Geral da República. No entanto, áudios obtidos pela Folha mostram um juiz auxiliar de Moraes preocupado com a informalidade dos pedidos e como isso poderia parecer desleal formalmente.
Vozes como Marcelo Figueiredo, professor de direito constitucional da PUC-SP, afirmam que a falta de formalidade pode comprometer a validade do julgamento, proporcionando uma brecha para solicitar a nulidade das provas ou até dos próprios inquéritos. Ele reforça a importância das formalidades no processo jurídico como garantias aos acusados.
Raquel Scalcon, consultora e professora de direito penal da FGV-SP, compartilha essa preocupação, mas enfatiza que a falta de documentação formal poderia invalidar apenas partes das provas, não o inquérito inteiro. Gustavo Sampaio, da UFF, acredita que a comunicação informal pode ser aceitável, desde que os procedimentos sejam posteriormente formalizados nos autos dos processos.
Mensagens instruindo a produção de relatórios focados em figuras específicas, como aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro e seu filho Eduardo, foram reveladas. Renato Ribeiro de Almeida, da USP, defende que a atuação de Moraes, com o poder de polícia da Justiça Eleitoral, não seria irregular, mesmo sem formalização prévia.
Ricardo Yamin, da PUC-SP, argumenta que a atuação informal pode ser justificada pela peculiaridade das funções acumuladas por Moraes. Todavia, ele ressalta a necessidade de preocupação com o dever de imparcialidade, ou seja, que as provas não sejam direcionadas para alcançar resultados premeditados.
Por fim, o cenário delineado por essas análises indica que a informalidade na comunicação entre tribunais e a falta de formalização dos procedimentos podem abrir brechas jurídicas consideráveis, suscetíveis a contestações que colocam em risco a validade de decisões e provas em processos altamente sensíveis.