Revisitação de Mrs. Dalloway: Miley Cyrus, Virginia Woolf e a performance de Kanye West nos Grammys – Análise Cultural e Crítica

No último ano, a presença de Miley Cyrus nos Grammys foi um dos assuntos mais comentados da cerimônia. A cantora arrasou com sua performance vestindo poucas roupas enquanto interpretava Flowers, uma canção pop orelhuda e cheia de balanço. No entanto, o significado por trás daquela atuação ia além da música. Para alguém que cresceu sob os holofotes como estrela infantil da Disney, evoluindo para uma artista com propósito, ver Miley no palco sozinha entoando “I can buy myself flowers” era uma declaração de independência e poder feminino.

Virginia Woolf, em sua obra Mrs. Dalloway, provavelmente teria apreciado a revisitação moderna desse momento. O fluxo de consciência de uma mulher decidida a comprar suas próprias flores, agora vivido como uma celebração de liberdade, refletia as possibilidades abertas para as mulheres na sociedade contemporânea. A presença de outras artistas como Taylor Swift, Kylie Minogue e Oprah Winfrey na plateia, dançando ao som da música, reforçava essa ideia de sororidade e empoderamento feminino.

No entanto, no mesmo evento, o talento de Beyoncé em sua mistura entre música country e negra foi ofuscado pela polêmica performance de Kanye West e sua esposa, Bianca Censori. O casal atraiu todas as atenções ao desfilarem na passadeira vermelha, com Kanye vestido de negro militar e Bianca revelando sua nudez total ao deixar cair um longo casaco de peles. Essa atitude, contrastante com a empoderada performance de Miley Cyrus no ano anterior, levantou questionamentos sobre o papel da mulher na sociedade e na indústria do entretenimento.

A performance de Bianca Censori, marcada por uma nudez repentina e sem propósito artístico, foi interpretada como um exercício de poder que diminuía o lugar da mulher, submetendo-a ao olhar do marido. O filósofo Giorgio Agamben discute em seu ensaio sobre a nudez como um evento marcado por uma herança teológica, que pode tanto representar uma privação quanto uma possibilidade de glória.

Em resumo, as performances nos Grammys daquele ano mostraram contrastes entre a celebração da liberdade e do poder feminino, representados por Miley Cyrus, e a submissão e objetificação da mulher, simbolizadas pela performance de Bianca Censori. Esses momentos refletem questões profundas sobre a representação da nudez e do corpo feminino na cultura popular contemporânea.

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