Um exemplo notório desse fenômeno ocorreu durante as manifestações de junho de 2013, quando máscaras inspiradas no personagem Guy Fawkes, do filme e quadrinhos “V de Vingança”, tomaram conta das ruas de São Paulo. Essas manifestações, que refletiram um descontentamento generalizado com o governo, foram uma clara demonstração de como a cultura de massa pode servir como veículo de resistência e contestação. O movimento, embora heterogêneo, expôs uma insatisfação profunda em relação ao Partido dos Trabalhadores (PT), que dominava a política brasileira na época.
A cena política não se limitou ao Brasil. Na Argentina, o personagem “O Eternauta”, de quadrinhos icônicos, se tornou um símbolo da esquerda, especialmente associado ao kirchnerismo e ao ex-presidente Néstor Kirchner. Essas narrativas demonstram como a ficção pode ser um reflexo das realidades sociais e políticas de um país, moldando identidades e enfoques ideológicos ao longo do tempo.
Recentemente, a tragédia de Francisco Wanderley Luiz, que se vestiu como o Coringa e detonou fogos de artifício na Praça dos Três Poderes, trouxe à tona discussões sobre a polarização política e o uso de símbolos de rebeldia. Ele expressou em suas redes sociais um forte desacordo com a Suprema Corte brasileira e o governo atual, destacando a relevância do Coringa como um símbolo “antissistema”. Essa utilização da ficção reflete uma dualidade nas interpretações artísticas e políticas, revelando como os personagens podem representar não apenas resistência, mas também extremismo.
O cartunista Carlos Latuff e os estudiosos como Alexandre Linck ressaltam que as obras de ficção não estão isoladas da vida real; elas são influenciadas e, frequentemente, moldadas pelos eventos sociais e políticos ao nosso redor. Isso nos leva a questionar o papel da arte na formação de ideologias e na mobilização social.
A conexão entre cultura, entretenimento e política é um campo em constante disputa, onde diversos personagens têm o potencial de ser apropriados por diferentes grupos e ideologias, dependendo do contexto histórico e social do momento. O estudo desta relação complexa nos ajuda a entender o papel das narrativas na formação da identidade coletiva e política, além de evidenciar como a arte pode ser uma ferramenta poderosa na expressão de vozes marginalizadas e movimentos populares.