O principal entendimento do STF é que, embora a convenção seja compatível com a Constituição brasileira, a entrega de crianças não deve ser feita de forma automática, especialmente quando há indícios de violência doméstica contra as mães ou contra os próprios menores. Essa preocupação surgiu em decorrência de múltiplos casos em que a Justiça brasileira havia autorizado a entrega de crianças a pais no exterior, mesmo em situações onde havia denúncias de abusos.
A problemática é ainda mais grave para mulheres que retornam ao Brasil com seus filhos, buscando escapar de situações de violência, mas que, ao chegarem, acabam enfrentando acusações de sequestro internacional por parte de ex-companheiros. Apesar da possibilidade de recusa à repatriação em casos de grave risco, decisões anteriores permitiam a entrega das crianças, gerando um cenário de insegurança e vulnerabilidade.
Na sessão de votação, a ministra Cármen Lúcia ressaltou que a prática de separar crianças de suas mães para entregá-las a pais estrangeiros reforça a visão negativa e objetificada das mulheres na sociedade. Ela afirmou que a Constituição de 1988 já reconhecia e buscava corrigir a coisificação das mulheres e dos menores, um problema ainda persistente nas decisões judiciais.
O debate sobre a interpretação das regras da Convenção da Haia no Brasil começou com uma ação movida pelo antigo partido DEM em 2009. A legenda argumentou que o retorno imediato de crianças ao seu país de origem deve estar alinhado com as garantias constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa. O partido criticou que decisões judiciais não realizavam uma investigação prévia acerca das condições em que as crianças foram trazidas ao Brasil, o que poderia colocar em risco o bem-estar delas.
Com esse novo entendimento do STF, espera-se que o sistema judiciário brasileiro passe a considerar mais atentamente as circunstâncias que envolvem a guarda e a proteção das crianças em casos de disputas internacionais, especialmente quando há indícios de violência.