A controvérsia girava em torno da capa da edição brasileira do livro, que incluía imagens de protestos contra a presença de Butler no Brasil em 2017. Um detalhe específico chamou a atenção: uma ilustração de Quico, personagem da Turma do Nosso Amiguinho, publicação dirigida ao público infantil pela editora ligada à Igreja Adventista. A editora Boitempo, conhecida por seu catálogo de obras acadêmicas e políticas, afirmou que a Casa Publicadora Brasileira, detentora dos direitos do personagem, poderia ter solicitado a retirada da imagem antes de recorrer ao litígio judicial.
Em declaração pública no blog da Boitempo, a editora lamentou a abordagem jurídica drástica adotada pela Casa Publicadora Brasileira. “A decisão judicial foi uma ação de grande impacto, desproporcional a um problema que poderia ter sido resolvido de forma direta e amigável”, disse a editora. A decisão, segundo a Boitempo, não apenas restringiu a circulação do livro, mas também destacou a perseguição constante enfrentada por Judith Butler por parte de segmentos conservadores da sociedade brasileira, que frequentemente rejeitam suas teorias sobre gênero.
A Boitempo relatou ainda um aumento significativo de ataques transfóbicos em suas redes sociais após o anúncio da publicação do livro no Brasil. Esse tipo de reação sublinha a tese central de Butler que explora como discursos conservadores utilizam o medo em torno de questões de gênero para instigar pânico moral e obter apoio para agendas políticas autoritárias e excludentes.
Em resposta, a Casa Publicadora Brasileira emitiu uma nota à imprensa, indicando que o processo judicial está sob segredo de justiça e pedindo respeito de todas as partes envolvidas até a resolução do caso. Enquanto isso, “Quem tem medo do gênero?” já voltou às livrarias, desta vez com uma nova capa, completamente preta, como forma de contornar as questões de direitos autorais.
A reintrodução do livro ao mercado representa não apenas um triunfo da liberdade de expressão, mas também um reforço à luta contra as tentativas de censura e repressão de ideias dissidentes. A editora Boitempo deixa claro que, apesar dos desafios, continuará a promover o acesso a obras que trazem contribuições significativas ao debate público sobre temáticas cruciais, como as levantadas por Judith Butler.