BRASÍLIA — A equipe econômica está discutindo a possibilidade de adiar os reajustes do salário-mínimo e dos servidores no ano que vem. Interlocutores da equipe informaram ao GLOBO que a ideia seria passar o reajuste do mínimo de janeiro para maio. Já no caso dos servidores, a data mudaria de agosto para dezembro. As duas ações seriam uma forma de reduzir os gastos do governo para compensar a provável frustração de várias receitas que foram incluídas na proposta orçamentária de 2016, mas que não devem se confirmar.
A proposta de adiamento, no entanto, não é consensual. Parte dos técnicos afirma que provocaria um desgaste político muito grande e não resolveria o desequilíbrio nas contas de 2016. Além disso, o atraso dos reajustes reduziria ainda mais o poder de compra da população, agravando a recessão da economia. A projeção oficial do governo é de que o PIB terá uma retração de 3,1% em 2015 e de 1,9% em 2016. Mesmo nesse cenário, a equipe econômica está preocupada em garantir a realização de um superávit de R$ 43,8 bilhões, em 2016, ou 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país).
SUGESTÃO DO LEGISLATIVO
Ontem à noite, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou que a proposta de adiar o reajuste do salário-mínimo não partiu do governo. Segundo Levy, a ideia foi de técnicos do Poder Legislativo e é apenas “um exercício aritmético”.
— Alguns técnicos apontaram alguns números. É só disso que eu tenho conhecimento. (…) Técnicos legislativos. Como fazem todos os anos, e não tem nada de mais. É um exercício aritmético, tá certo? Ele adquiriu apenas mais ressonância na medida em que outras ações (para equilibrar o Orçamento de 2016) ainda não avançaram no ritmo necessário. Não sei de onde apareceu a ideia de que é proposta do governo — disse Levy.
O possível adiamento do reajuste do mínimo e dos servidores foi discutido com parlamentares nas últimas semanas. Segundo técnicos da área econômica, a sugestão para que a medida fosse adotada, embora tenha mesmo vindo de técnicos do Legislativo, foi acolhida como alternativa a se estudar. A proposta seria editar uma medida provisória até o fim do ano mudando a data. Procurado, o Palácio do Planalto admitiu que essa foi uma de várias ações propostas pelo Congresso para avaliação no governo. No entanto, não há nada decidido.
— Adiar (os reajustes) não está no radar — disse um integrante do Planalto.
Levy, no entanto, alertou para o fato de que o Congresso precisa votar logo o Orçamento de 2016 e as medidas propostas pela equipe econômica para cumprir a meta de superávit primário de 0,7% do PIB. Segundo ele, sem as medidas, que incluem a recriação da CPMF, acabam surgindo “outras ideias”:
— Toda a base de apoio ao governo, incluindo evidentemente o PT, tem que se mobilizar pelo Brasil, para a gente ter o fiscal que a gente precisa, o orçamento que o Brasil precisa, as receitas que o Brasil precisa para não surgirem outras ideias, que daqui a pouco aparecem.
Até 2006, o reajuste do mínimo ocorria em maio. Naquele ano, o governo fez um acordo com as centrais sindicais para que a correção fosse antecipada em um mês a cada ano até chegar a janeiro. A correção sempre no primeiro mês foi formalizada em 2011. Pela regra em vigor, o salário é corrigido com base na inflação medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) do ano anterior mais a variação do PIB de dois anos antes. Pela proposta orçamentária de 2016, a remuneração básica dos trabalhadores será de R$ 865,5.
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A política de reajuste do salário-mínimo vigora até 2019 e é uma das principais fontes de pressão no aumento de gastos, pois impacta as contas da Previdência Social. Para cada três segurados, dois recebem benefícios equivalentes ao mínimo. O déficit projetado para o próximo ano só nas contas da Previdência é de quase R$ 125 bilhões.
CPMF E REPATRIAÇÃO
Outra economia para o governo seria com o adiamento do reajuste dos servidores. O problema é que a equipe econômica já jogou para frente o reajuste de 2016. Inicialmente previsto para janeiro, foi adiado para agosto, como parte do esforço para reequilibrar o Orçamento. A proposta orçamentária foi enviada ao Congresso com déficit de R$ 30,5 bilhões, o que acabou provocando o rebaixamento da nota do país. Ao passar o reajuste para agosto, a economia com gastos obrigatórios foi estimada pelo governo em R$ 7 bilhões.
A equipe econômica tem grande preocupação com o cenário de receitas do ano que vem. Para assegurar o superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) de 0,7% do PIB, o governo precisa, entre outras coisas, aprovar no Congresso a recriação da CPMF e o projeto da repatriação, que permite a legalização de recursos enviados ao exterior sem aviso à Receita Federal. Essas propostas estão emperradas e não devem mais resultar na arrecadação esperada originalmente. No caso da CPMF, a Receita já enviou ao Congresso mensagem dizendo que a arrecadação inicial, estimada em R$ 32 bilhões, agora é de R$ 24 bilhões.
O Globo