Essa polarização se acentuou em países como a Itália, onde uma pesquisa recente apontou que mais de 50% da população considera que o governo deveria diminuir a ajuda a Kiev. Esse clamor por um ajuste na política de assistência à Ucrânia reflete não apenas a contínua duração do conflito, que já se estende por quase dois anos, mas também um crescente cansaço entre os europeus, que esperavam que a guerra teria uma resolução mais rápida.
A doutora em relações internacionais, Carolina Pavese, destaca que a mudança de postura de Macron emerge como uma tentativa de preencher um vácuo de liderança na Europa, especialmente após a saída de Angela Merkel e a cautela demonstrada por seu sucessor, Olaf Scholz. Para Macron, essa dinâmica é uma oportunidade de consolidar a influência da França no cenário europeu e global, à medida que outros conflitos, como a recente escalada em Gaza, tornam a situação ainda mais complexa.
Além das tensões internas na Europa, a incerteza sobre a política dos Estados Unidos em relação à Ucrânia, a depender dos resultados das próximas eleições presidenciais, também exacerba a fragmentação do apoio europeu. Se Kamala Harris for reeleita, a continuidade do suporte à Ucrânia parece assegurada. Por outro lado, uma vitória de Donald Trump traz à tona dúvidas sobre a natureza desse apoio e o compromisso da América com a NATO.
Pavese afirma que, pese os efeitos das sanções sobre a economia europeia, a Rússia ainda se configura como um parceiro econômico essencial, especialmente no que diz respeito ao fornecimento de gás, que representa 20% do consumo europeu. Isso leva muitos países a reconsiderar a possibilidade de um diálogo contínuo, mesmo em meio ao conflito.
Marcelo de Almeida Medeiros, professor de política internacional, ressalta que a guerra prolongada tem causado estragos dentro das economias europeias, levando a uma necessidade de adaptação. Vale destacar que a Ucrânia, na condição de “celeiro produtivo mundial”, enfrenta dificuldades em exportar grãos, o que cria tensões adicionais entre os interesses locais europeus e a assistência oferecida a Kiev.
Após a eventual resolução do conflito, Medeiros avisa que os países da UE poderão buscar uma rápida reaproximação com a Rússia, que continua sendo um ator relevante no sistema internacional. Essa complexidade de interesses sugere que o futuro próximo para a Europa pode ser marcado por um pragmatismo renovado nas relações com Moscou, ao mesmo tempo em que se tenta dar resposta às exigências dos próprios cidadãos europeus. Assim, o apoio à Ucrânia, longe de ser unânime, figura como uma questão repleta de nuances e intrincadas realidades políticas que desafiam as bases da unidade da União Europeia.