Titã é já famosa por seus lagos de metano e etano, além de uma atmosfera repleta de compostos orgânicos, criando um ambiente químico complexo com paralelos à química que precedeu a vida na Terra. Entre esses compostos está o cianeto de hidrogênio, uma molécula polar chave na formação de aminoácidos e nucleobases. Segundo a regra clássica da química, “semelhante dissolve semelhante”, moléculas polares como o cianeto não deveriam misturar-se com apolares, como o metano e etano. Contudo, experimentos conduzidos pela NASA a -180 °C revelaram interações inesperadas entre essas substâncias.
Foi necessário um esforço colaborativo entre cientistas da NASA e da Chalmers, que resultou em experimentos utilizando espectroscopia Raman. Esses testes mostraram mudanças sutis nas vibrações moleculares do cianeto em contato com hidrocarbonetos apolares, indicando uma interação real que contradizia as expectativas convencionais. Modelagens computacionais corroboraram a teoria de que metano e etano se encaixavam na estrutura cristalina do cianeto de hidrogênio, formando cocristais estáveis em temperaturas baixas.
Essa descoberta não só desafia as leis da química, mas também pode ter importantes implicações para o entendimento da geologia e dinâmicas da superfície de Titã, especialmente no que se refere à formação de mares, lagos e dunas na lua. No entanto, a confirmação direta desses cocristais ainda exigirá tempo — a sonda Dragonfly, da NASA, responsável por investigar essas formações mais de perto, só deverá chegar a Titã em 2034. Assim, os cientistas continuam a explorar os limites da química em mundos distantes, redescobrindo que até mesmo as regras mais fundamentais da ciência podem ter exceções.