CONCHAVO? – Após parecer de Lira, ricos do agronegócio escapam de alta no IR proposta por Lula – com Jornal Rede Repórter

A proposta do governo Lula para isentar do Imposto de Renda (IR) quem ganha até R$ 5 mil por mês e aumentar a tributação sobre os mais ricos avançou com facilidade na comissão especial da Câmara dos Deputados, mas com uma mudança articulada pelo relator do projeto, deputado Arthur Lira (PP-AL), que acabou beneficiando diretamente os grandes produtores rurais.

O parecer de Lira — aprovado na quarta-feira (16/7) — alterou o texto original do governo ao excluir a parcela isenta da renda obtida com atividade rural da base de cálculo do novo imposto mínimo. A mudança, que passou praticamente despercebida nos debates públicos, preserva uma fatia significativa dos ganhos de produtores rurais de alta renda da tributação adicional. Estimativas apontam que essa exclusão poderá reduzir a arrecadação esperada entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões por ano.

Segundo dados da Receita Federal, em 2022, pessoas físicas com rendimentos acima de R$ 600 mil declararam R$ 61,8 bilhões em renda rural isenta. Pela proposta original do governo, esses valores seriam parcialmente alcançados pelo novo imposto, com alíquota progressiva entre 0% e 10%, dependendo do montante total de rendimentos.

A mudança foi criticada por especialistas em tributação e pelo Sindifisco (sindicato dos auditores da Receita Federal), que apontam distorções no sistema atual. Hoje, produtores que optam pela tributação como pessoa física no regime de lucro presumido pagam IR sobre apenas 20% de seu faturamento, sem necessidade de comprovar custos, o que já lhes garante ampla margem de isenção. “O lobby do agro conseguiu manter esse privilégio”, criticou o tributarista Leonardo Aguirra de Andrade, ouvido pela comissão.

Mesmo com as alterações, o parecer de Lira mantém a espinha dorsal da proposta de “justiça tributária” defendida pelo governo: a isenção do IR para rendas de até R$ 5 mil mensais e a criação do imposto mínimo sobre rendas altas. O relator ainda ampliou a faixa de renda com alívio parcial — de R$ 7 mil para R$ 7.350 — o que implicará em renúncia fiscal adicional de R$ 1 bilhão, segundo o Sindifisco.

O Ministério da Fazenda estima que a proposta original resultaria em renúncia de R$ 25,8 bilhões com os cortes no IR, compensada por uma arrecadação de R$ 34,1 bilhões com a criação do imposto mínimo e taxação de dividendos enviados ao exterior. Apesar das concessões feitas no relatório, o ministro Fernando Haddad comemorou o resultado. “Vai ser muito bem recebido e cumpre os objetivos da reforma da renda”, disse.

Por outro lado, economistas alertam que, com o novo desenho, parte significativa das rendas altas continuará fora do alcance do fisco. Sérgio Gobetti, do IPEA, calculou que as alterações feitas por Lira reduzem a arrecadação esperada em cerca de R$ 4 bilhões — R$ 3 bilhões pela exclusão da renda rural e mais R$ 1 bilhão por outras isenções incluídas na base de cálculo.

Segundo dados da Receita, os brasileiros que ganham mais de R$ 1 milhão por ano têm uma alíquota efetiva de IR de apenas 2,5%, menor do que a paga por professores ou assistentes sociais. O novo imposto mínimo busca corrigir parte dessa distorção, exigindo que esses contribuintes completem a diferença até uma alíquota mínima de 10%.

A Frente Parlamentar da Agropecuária, questionada pela BBC News Brasil sobre o favorecimento ao setor, não respondeu até a publicação da reportagem. O deputado Arthur Lira também não se manifestou. Em seu parecer, ele alegou que buscava “neutralidade tributária” e destacou que críticas sobre proteger os super-ricos o levaram a desistir de reduzir a alíquota do novo imposto, preferindo ampliar os benefícios para a base da pirâmide.

Além disso, Lira definiu que eventuais excessos de arrecadação serão usados para compensar perdas de Estados e municípios ou para reduzir a alíquota do novo imposto sobre consumo, o CBS, que afeta mais fortemente os mais pobres.

Ainda assim, especialistas apontam que a reforma aprovada na comissão pode ter sido tímida diante da oportunidade de enfrentar os privilégios fiscais dos mais ricos. Para o Sindifisco, seria necessário corrigir a tabela do IR pela inflação e aplicar uma alíquota mínima ainda maior — de até 15% — sobre rendas elevadas, para garantir justiça tributária de fato.

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