Crescimento do Feminicídio no Brasil: Uma Epidemia Invisível
A cada dez anos desde a promulgação da Lei do Feminicídio, o Brasil testemunha um aumento alarmante nos casos de assassinatos de mulheres em função de seu gênero. Em um recente estudo divulgado na Câmara dos Deputados, que faz parte da campanha “21 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres”, os números revelam uma escalada preocupante: os registros saltaram de 527 em 2015 para 1.455 em 2024, representando um crescimento de 176%.
Os dados indicam que 68% das vítimas de feminicídio eram mulheres negras, trazendo à tona uma questão crucial: a intersecção entre raça e violência de gênero. Apesar de uma ligeira queda nos casos envolvendo mulheres brancas, a violência contra mulheres pretas e pardas aumentou, destacando a necessidade de políticas públicas que considerem as particularidades raciais e de classe social. Segundo a especialista em gênero Jackeline Ferreira Romio, da Fundação Friedrich Ebert, a violência de gênero não pode ser dissociada do racismo institucional. Romio enfatiza que a falta de uma abordagem interseccional nas políticas públicas contribui para a perpetuação dessa tragédia.
Ela também alerta que os dados disponíveis podem subestimar a magnitude do problema, uma vez que nem todos os casos de mortes violentas de mulheres são investigados. Estima-se que entre 3.500 e 4.000 mulheres morram anualmente por causas violentas no Brasil, das quais cerca de 2.500 seriam feminicídios. “Quando se cruzam esses dados com as estatísticas da saúde, vemos que a taxa de feminicídio pode ser considerada uma epidemia”, afirma Romio.
Além disso, o Brasil ocupa o triste primeiro lugar em feminicídios na América Latina e no Caribe, com a média de 11 mulheres sendo assassinadas por dia na região, quatro delas brasileiras. A ativista Bárbara Martins, coordenadora do Projeto Reconexão Periferias, aponta que o verdadeiro desafio não é a escassez de legislações, mas a ineficiência dos protocolos administrativos já existentes. Martins destaca que a administração pública deve ser eficiente e organizada, conforme disposto no artigo 37 da Constituição, e a sua falha nesse aspecto configura uma violação de direitos.
A deputada Jack Rocha (PT-ES), secretária da Mulher na Câmara, expressou sua intenção de elaborar um projeto de lei que responsabilize gestores públicos que não implementem o orçamento para reduzir desigualdades de gênero e raça. Rocha acredita que é fundamental discutir como a economia e a formação orçamentária podem ser direcionadas para o combate à violência, não apenas em termos de punição, mas também reconhecendo as mulheres como cidadãs com direitos plenos.
A pesquisa “Quem são as mulheres que o Brasil não protege?” foi apresentada na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, um lembrete sombrio da urgência em combater essa epidemia que afeta tantas vidas.
