BRASÍLIA – Bolsonarista Alfredo Gaspar é escolhido relator de pedido que pode beneficiar Ramagem e tensiona relação entre Câmara e STF

O deputado federal Alfredo Gaspar (União Brasil-AL) foi designado relator do pedido que pode levar à suspensão da ação penal contra Alexandre Ramagem (PL-RJ), acusado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de integrar o núcleo de uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. A escolha de Gaspar, aliado declarado do ex-presidente Jair Bolsonaro, gerou forte reação entre parlamentares governistas, que enxergam a medida como um passo estratégico da oposição para blindar Bolsonaro e seus aliados.

Ramagem, atual deputado federal, tornou-se réu no STF em março, mas por ter sido diplomado em dezembro de 2022, a Constituição permite que a Câmara analise pedidos para suspender ações penais por crimes supostamente cometidos após essa data. A solicitação tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), presidida por Paulo Azi (União Brasil-BA), que confirmou Gaspar na relatoria. O colegiado tem até o fim do mês para votar o parecer, e o plenário da Câmara dispõe de 45 dias para decidir sobre o caso.

Gaspar, ex-procurador-geral de Justiça de Alagoas, é um nome de peso entre os bolsonaristas na Câmara. Recentemente, assinou o requerimento de urgência do projeto de anistia aos envolvidos nos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023. Ao ser procurado pela reportagem, afirmou que fará uma análise técnica e criteriosa do caso, apesar do “inevitável” peso político da matéria.

Nos bastidores, deputados do centrão questionaram a escolha do relator. Um aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), declarou que um nome mais moderado teria gerado menos ruído político. A avaliação entre aliados do governo Lula (PT) é que a indicação de Gaspar revela uma ofensiva bolsonarista para criar embaraços ao Supremo Tribunal Federal e testar o apoio parlamentar a uma eventual anistia a Bolsonaro.

Três ministros do STF ouvidos reservadamente pela Folha demonstraram preocupação. Para eles, a Câmara pode tentar tumultuar o processo penal de Ramagem, ainda que a suspensão parcial da ação tenha efeito limitado. Isso porque a maioria dos crimes atribuídos a Ramagem teriam ocorrido antes da diplomação, o que impediria a intervenção do Congresso sobre esses atos.

O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), entrou com uma petição no STF pedindo que a Corte delimite quais crimes foram cometidos antes e depois da diplomação de Ramagem. Ele acusa a oposição de tentar sabotar o julgamento de Bolsonaro. “Querem trancar toda a ação penal, numa nova aberração institucional”, criticou.

Já o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), defendeu o pedido e afirmou que sua aprovação poderá paralisar toda a investigação contra Ramagem. “O recurso é um direito dos parlamentares, não tem nada a ver com o projeto de anistia. Mas não tenho dúvidas de que o inquérito será trancado”, declarou.

Nos corredores da Câmara, a votação do caso Ramagem é vista como um termômetro da disposição da Casa em apoiar a pauta da anistia aos golpistas de 8 de janeiro — medida que pode, na prática, beneficiar também o próprio Bolsonaro.

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