As facilidades do crédito consignado, amplamente promovido como alternativa de empréstimo com juros baixos, têm se transformado em uma armadilha financeira para milhões de aposentados e servidores públicos no Brasil. Em meio a denúncias de fraudes e contratos firmados sem consentimento, o setor movimentou, apenas em 2023, cerca de R$ 90 bilhões — parte significativa sob suspeita.
Segundo auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), mais de 35 mil reclamações formais foram registradas em um único ano. A Polícia Federal investiga um rombo estimado em R$ 6 bilhões decorrente de cobranças indevidas, em um esquema que atinge diretamente a dignidade e o sustento de idosos, muitos dos quais dependem exclusivamente da aposentadoria para sobreviver.
As vítimas, em grande parte, só percebem os descontos após meses, quando os danos já estão consolidados. Muitos não têm acesso à informação ou recursos para contestar os débitos. Para especialistas em educação financeira, é fundamental que familiares acompanhem de perto os extratos e contratos dos aposentados, dada a alta probabilidade de fraudes.
O problema se agravou a ponto de o Congresso cogitar a instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), embora o governo federal tenha resistido, temendo desgaste político. A recente troca de comando no Ministério da Previdência aponta para a dimensão do caso, mas medidas mais firmes ainda são esperadas, como o fortalecimento da fiscalização, punição aos responsáveis e ampliação da educação financeira.
Apesar do cenário, o crédito consignado não deve ser tratado como vilão absoluto. Quando usado com responsabilidade e pleno conhecimento das condições envolvidas, pode ser um recurso útil. No entanto, o desconto direto em folha compromete a renda do beneficiário e exige planejamento rigoroso.
Casos de familiares ou terceiros que utilizam indevidamente o nome de aposentados para contratar empréstimos também preocupam. A prática, além de ilegal, impõe prejuízos severos à vítima e expõe a fragilidade de um sistema pouco protegido contra abusos.
Diante do aumento das fraudes, especialistas reforçam orientações básicas: não assinar contratos sem compreender as cláusulas, verificar com frequência os extratos, desconfiar de ofertas por telefone ou mensagens e buscar apoio jurídico em caso de suspeitas.
Para Reinaldo Domingos, presidente da Associação Brasileira de Profissionais de Educação Financeira (ABEFIN), o cenário é alarmante. Ele defende a ampliação do acesso à informação e ações coordenadas para evitar que os aposentados continuem sendo alvo de dívidas impagáveis. “Eles merecem respeito, não contratos que jamais autorizaram”, conclui.