A Última Melancia: Reflexões sobre Paternidade e Cotidiano Inspiradas pela Última Obra de Frida Kahlo

Oito dias antes de sua morte, Frida Kahlo criou sua última obra, uma vibrante natureza morta repleta de melancias, nas quais ela deixou gravada a frase “Viva la Vida”. Este belo fruto, símbolo de alegria e abundância, carrega em si reminiscências de felicidade e se torna um reflexo da vida intensa e repleta de sofrimento da icônica artista mexicana, cuja trajetória foi marcada pela intensidade emocional e pela busca pela expressividade em sua arte.

A imagem da melancia evoca lembranças de uma experiência pessoal, ocorrida em um movimentado ponto de ônibus na Asa Norte. Em um típico sábado à tarde, um homem de feições robustas, com traços marcados pelas dificuldades da vida, carregava uma melancia em seu colo. O cenário era de um terminal repleto de pessoas ansiosas para voltar para casa, e, assim, a presença daquela melancia começou a me incomodar. O que levara aquele homem a transportar um fruto tão volumoso em meio a tanta agitação? Meus pensamentos foram tomados pela inquietação e pela frustração, imaginando como aquela fruta ousava conquistar tanto espaço e atenção no ônibus.

As visões que passei a criar em minha mente eram de um transporte tumultuado, em que a melancia, com seu formato oval e imponente, poderia se transformar em um obstáculo incômodo, dificultando a passagem. No entanto, esse desconforto logo se desfez quando o homem ao seu lado começou a compartilhar uma doce recordação. Ele falava com entusiasmo sobre como sempre levava uma melancia para casa aos sábados, um gesto de carinho para seus filhos, que adoravam a fruta. A melancia não era apenas um alimento, mas um símbolo de amor paternal, ligada a memórias de infância, quando seu pai fazia o mesmo.

Ao ouvir suas palavras, um novo sentimento aflorou em mim. O orgulho e a satisfação que transpareciam de sua voz me fizeram perceber a importância daquela melancia. Não era apenas uma inconveniência passageira, mas o portador de uma felicidade genuína que ele compartilhava com seus filhos. Quando o ônibus finalmente chegou, hesitei ao sentido de espaço. Impulsivamente, recuei e deixei que o homem e sua melancia passassem na minha frente. Sentimentos de ciúme e admiração se misturaram, e percebi que, naquele pequeno gesto, havia amor, tradição e uma alegria pura que transcende as dificuldades da vida.

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